sábado, 31 de outubro de 2015

pergunta

quem você quer impressionar com sua tentativa obsessiva de alcançar a virtude? o mundo? a você mesmo? os dois? o ego? qual a mensagem que você quer passar com a construção de sua "OBRA"? o que você quer provar com essa insistência doentia de se achar importante? o que é exatamente essa busca pelas respostas que você já sabe? quer reconhecimento? fama? dinheiro? quer aparecer na TV? quer ser parado na rua e tirar "selfies" com seus "FÃS"? você quer mesmo ter "FÃS"? e dar autógrafos? é ambição? ou ganância? você se acha especial? com um dom divino? se acha maior do que todos? acha que o que você faz é muito importante? mesmo? você só elogia os mais bem sucedidos? porque? por interesse? eles são talentosos de verdade? então o que é talento? quer uma carona pra alcançar um lugar ao sol? quer privilégios que você ainda não tem? quer levar tapinhas nas costas? quer ouvir elogios pra inflar seu ego? mesmo sabendo que é tudo mentira? tem certeza? está preparado pra ouvir que você não nasceu pra isso? está? mesmo que tenha? em quem você vai acreditar depois? em quem?

marcelozorzeto

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

da série: meus possíveis epitáfios #171

fui um homem-precário, desafinei feio no tempo, semitonei em todos os meus sonhos, todos sem nenhuma expressão. errei a letra daquela canção, de amor, ridícula, mas que eu amava muito. fui um otário. fui um homem-conflito, deixei queimar o arroz das boas intenções e não me encaixei nos detalhes, não. e no genérico fui bem mal visto também. inventei frases, desejos e medos. pior, desejei os medos. preconizei o meu fracasso que já era anunciado. fui um aflito. fui um homem-retalho. patinei no meu caráter. escorreguei no meu humor. abusei da piada pronta. madruguei no feriado. insisti no trocadilho. fui um espantalho. fui um homem-pomba. me chutaram na calçada. e sempre odiei milho de pipoca. caguei em muitas cabeças. caguei em cabeças demais meu deus. fui uma sombra e tudo isso me custou caro. me custou saliva, muita saliva, meu caro. fui um homem-cuspe e me babei todo na vida.

marcelozorzeto







sexta-feira, 23 de outubro de 2015

não conto com fadas

No sábado de manhã, ele passava de carro pela rua dela. No toca-fitas um Odair José bem alto, quase arrebentado o alto-falante do seu Corcel II 84. Ela na calçada, indignada com o gosto que ela considera brega do rapaz do Corcel II 84 grita: CAFONA
Ele para, baixa o vidro à manivela e despretensioso pergunta: PRA ONDE?
Pronto! Um breve silêncio e todo um mundo de Odair José, Amado Batista e Reginaldo Rossi pela vida a frente a dois. discos na estante e uma vitrola que não parou mais de tocar. Casa alugada, filhos e e muito amor pra dar.
marcelozorzeto

terça-feira, 20 de outubro de 2015

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são as estrelas de um céu vaidoso, que me encontro às vezes a contá-las, à noite, a cantá-las por através das nuvens. um brilho silencioso, passado meteórico, anjos em cores. um querer alado, pavão melancólico, alarido profético estampado no azul escuro de um céu infinito.
por elas, sou apenas olhares, sou paixão pelos seus ares, e nos meus olhos aos pares as trago.
encanto e serenidade.
entrego-me à cintilante presença de um tempo em que as horas já não são mais...
um sinuoso adeus.
o vaidoso céu é um oásis de ponta-cabeça,
invenção nostálgica a preencher os nossos dias de amanhãs
e depois?
marcelozorzeto

sábado, 17 de outubro de 2015

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

renascimento

desfrutar o mar
pomar de areias finas
fruta-estrela aos pés do homem
que também se encanta
deleito-me ainda no chumbo das horas
contemplar a dor
uma saudade cor azul-do-céu
são cavalos marinhos pelos campos naufrágios
corais e corações contemplados
entrelaçados na subida da maré
espanto-me na alegria jubilosa de pertencer e estar
respeitar o ir
são as ondas que partem retirantes
e levam o gosto do sal da terra
para o deus do profundo chão
a minha pele é lava e cintilância
meu corpo-maresia adormece vago
repousa num sorriso estandarte
posso agora renascer no eterno do tempo.

marcelozorzeto

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

a cidade dos meus botões

cidade acelerada
desencontrada
vizinhos invisíveis
amigos divisíveis
café, pastel e solidão

empatia em desatino
entre gente quase-gente
entre máquinas e almas
entre carros e fumaça

uma vida pra se ver
um ano pra se encontrar
corações ocupados
distraídos
de novidade fria e estéril

cidade-rua
muitas ruas
cidade-bar
muitos bares
bêbados na madrugada
em suas buscas incessantes pelo  invisível

cidade-pressa
cidade-presa
cidade-pombo-de praça
lixo, milho e insanidade

cidade pluma
concreto e espuma
rios tão sólidos
como os rostos na lotação

cidade-prédio
cidade-céu-não-há
felicidade-um-feriado
assim eu sou
assim eu sigo
entre chagas e signos
saciedade em meus botões.

marcelozorzeto

passagem

sinto do meu quarto o cheiro farto e ofegante que vem do fim da madrugada
que traz o futuro
que se rasga em presente
que nos livra da noite com os primeiros raios tímidos de sol

manhã sem sutileza, quase capital
a neblina insistente encobre com o cinza o que antes também já era cinza
um novo dia trazendo aquela mesma velha oração
enferrujada pelas horas

os olhos que contemplam o céu azul-chumbo
se enchem de esperança e se fecham finalmente
repouso minha fé e meu corpo
nas cinzas da noite que se foi
foram tempos difíceis eu sei.

marcelozorzeto

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

se era

se era tanto que fosse mais
se era mau que fosse caos
se era pouco que fosse louco
se era paz que fosse cais
se era escuro que fosse um muro
se era bomba que fosse sombra
se era eu que fosse um breu

se era tanto que fosse caos
se era mau que fosse louco
se era pouco que fosse muro
se era paz que fosse cais
se era escuro que fosse sombra
se era bomba que fosse breu
se era eu que fosse mais

se era tanto que fosse muro
se era mau que fosse sombra
se era pouco que fosse breu
se era paz que fosse mais
se era escuro que fosse caos
se era bomba que fosse cais
se era eu que fosse louco

marcelozorzeto

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

a borboleta


leve
indelével
mármore e flor
efêmero
tempos
dores e encontros
mistério


marcelozorzeto
encontrar é estar aberto ao(s) desconhecido(s)
é como dar um passo no escuro
você sente o chão sair do lugar
um momento de suspensão
e de repente nos conectamos com uma nova e surpreendente parte de nós mesmos

o espaço entre o pé que flutua e o chão
é o tempo que dura o medo
um abismo imaginário
é um suspiro de ausência
que em segredo se desfaz
e nos torna mais potentes

viver é se atirar em pequenos abismo diários.



marcelozorzeto