Clarividente de seus próprios atos, ela fechou seus olhos e gritou. Gritava em direção às pedras que rolavam no espaço aberto, sem saber com tanta certeza se tomaria ou não a mesma direção. Seu grito retumbante soou por algum tempo.
Nuvens a observavam duramente com um olhar bastante repreensivo. Alguns pássaros a encaravam, achando haver algum tipo de concorrência no ar, mas logo a deixaram por sua própria conta e risco. Atordoada pelo seu próprio quase miasma, lentamente levantou um dos pés do chão em direção ao vazio. Era como se entre um passo e outro a eternidade se aproximasse de seu corpo nitidamente finito. A um passo da eternidade... A um passo do infinito... Era muito espaço para pouco corpo o que ela tinha.
Absolutamente certa da decisão tomada, com uma certeza que lhe saltava aos olhos em forma de lágrima, deu o segundo passo sem prender a respiração e flutuou por alguns instantes como um anjo caído já sem as asas. Foram alguns segundos até o fim. Instantes, que aos olhos de quem vê, não duram mais que um beijo dado em quem não se ama mais.
A poesia do momento se eternizou em suas retinas e em seu rosto sereno. Um ar de despedida pairou no frio e úmido silêncio das rochas da praia deserta. Ondas vinham de todas as partes para saudar a nova visitante. Ela já não se importava mais com a recepção e observava tudo com olhos tristes e um certo tom de apatia e desdém nos lábios, percebido também em sua pele pálida e ainda morna. Ao longe, o sol a se pôr no horizonte cor de maçã do amor. Enquanto os amigos, estes sempre atrasados, não chegavam para a última festa, a contemplação se dava por absoluta, por inteira. Por fim só.
marcelozorzeto