quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

sem nome

todo poeta anda pelo meio-fio de uma navalha cortante, com o sol efervescente da tarde, pulverizando seus quase sonhos. teima em enxergar um futuro no horizonte que sempre tende a se acabar em pó. levita as fagulhas, voa com anjos de barro, flutua em nuvens de ferro e chumbo. se banha na chuva da morte, no ácido na chuva, vaporiza seu sangue, alquimia do meu sangue... e no paraíso, com o chão em brasa, se arrisca sempre a andar com os pés descalços.

marcelozorzeto

o mundo anda

anda o mundo tão arbitrário
tão sanitário
tão solidão

é mesmo sem sentido
e caótico o mundo-cão
bate forte o meu desejo
e descompassado o coração

anda o mundo tão ao contrário
tão salafrário
tão aflição

no amor, estagiários
sem saber da oração
a metade do rosário
ou um verso da canção.

marcelozorzeto

sábado, 31 de outubro de 2015

pergunta

quem você quer impressionar com sua tentativa obsessiva de alcançar a virtude? o mundo? a você mesmo? os dois? o ego? qual a mensagem que você quer passar com a construção de sua "OBRA"? o que você quer provar com essa insistência doentia de se achar importante? o que é exatamente essa busca pelas respostas que você já sabe? quer reconhecimento? fama? dinheiro? quer aparecer na TV? quer ser parado na rua e tirar "selfies" com seus "FÃS"? você quer mesmo ter "FÃS"? e dar autógrafos? é ambição? ou ganância? você se acha especial? com um dom divino? se acha maior do que todos? acha que o que você faz é muito importante? mesmo? você só elogia os mais bem sucedidos? porque? por interesse? eles são talentosos de verdade? então o que é talento? quer uma carona pra alcançar um lugar ao sol? quer privilégios que você ainda não tem? quer levar tapinhas nas costas? quer ouvir elogios pra inflar seu ego? mesmo sabendo que é tudo mentira? tem certeza? está preparado pra ouvir que você não nasceu pra isso? está? mesmo que tenha? em quem você vai acreditar depois? em quem?

marcelozorzeto

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

da série: meus possíveis epitáfios #171

fui um homem-precário, desafinei feio no tempo, semitonei em todos os meus sonhos, todos sem nenhuma expressão. errei a letra daquela canção, de amor, ridícula, mas que eu amava muito. fui um otário. fui um homem-conflito, deixei queimar o arroz das boas intenções e não me encaixei nos detalhes, não. e no genérico fui bem mal visto também. inventei frases, desejos e medos. pior, desejei os medos. preconizei o meu fracasso que já era anunciado. fui um aflito. fui um homem-retalho. patinei no meu caráter. escorreguei no meu humor. abusei da piada pronta. madruguei no feriado. insisti no trocadilho. fui um espantalho. fui um homem-pomba. me chutaram na calçada. e sempre odiei milho de pipoca. caguei em muitas cabeças. caguei em cabeças demais meu deus. fui uma sombra e tudo isso me custou caro. me custou saliva, muita saliva, meu caro. fui um homem-cuspe e me babei todo na vida.

marcelozorzeto







sexta-feira, 23 de outubro de 2015

não conto com fadas

No sábado de manhã, ele passava de carro pela rua dela. No toca-fitas um Odair José bem alto, quase arrebentado o alto-falante do seu Corcel II 84. Ela na calçada, indignada com o gosto que ela considera brega do rapaz do Corcel II 84 grita: CAFONA
Ele para, baixa o vidro à manivela e despretensioso pergunta: PRA ONDE?
Pronto! Um breve silêncio e todo um mundo de Odair José, Amado Batista e Reginaldo Rossi pela vida a frente a dois. discos na estante e uma vitrola que não parou mais de tocar. Casa alugada, filhos e e muito amor pra dar.
marcelozorzeto

terça-feira, 20 de outubro de 2015

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são as estrelas de um céu vaidoso, que me encontro às vezes a contá-las, à noite, a cantá-las por através das nuvens. um brilho silencioso, passado meteórico, anjos em cores. um querer alado, pavão melancólico, alarido profético estampado no azul escuro de um céu infinito.
por elas, sou apenas olhares, sou paixão pelos seus ares, e nos meus olhos aos pares as trago.
encanto e serenidade.
entrego-me à cintilante presença de um tempo em que as horas já não são mais...
um sinuoso adeus.
o vaidoso céu é um oásis de ponta-cabeça,
invenção nostálgica a preencher os nossos dias de amanhãs
e depois?
marcelozorzeto

sábado, 17 de outubro de 2015

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

renascimento

desfrutar o mar
pomar de areias finas
fruta-estrela aos pés do homem
que também se encanta
deleito-me ainda no chumbo das horas
contemplar a dor
uma saudade cor azul-do-céu
são cavalos marinhos pelos campos naufrágios
corais e corações contemplados
entrelaçados na subida da maré
espanto-me na alegria jubilosa de pertencer e estar
respeitar o ir
são as ondas que partem retirantes
e levam o gosto do sal da terra
para o deus do profundo chão
a minha pele é lava e cintilância
meu corpo-maresia adormece vago
repousa num sorriso estandarte
posso agora renascer no eterno do tempo.

marcelozorzeto

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

a cidade dos meus botões

cidade acelerada
desencontrada
vizinhos invisíveis
amigos divisíveis
café, pastel e solidão

empatia em desatino
entre gente quase-gente
entre máquinas e almas
entre carros e fumaça

uma vida pra se ver
um ano pra se encontrar
corações ocupados
distraídos
de novidade fria e estéril

cidade-rua
muitas ruas
cidade-bar
muitos bares
bêbados na madrugada
em suas buscas incessantes pelo  invisível

cidade-pressa
cidade-presa
cidade-pombo-de praça
lixo, milho e insanidade

cidade pluma
concreto e espuma
rios tão sólidos
como os rostos na lotação

cidade-prédio
cidade-céu-não-há
felicidade-um-feriado
assim eu sou
assim eu sigo
entre chagas e signos
saciedade em meus botões.

marcelozorzeto

passagem

sinto do meu quarto o cheiro farto e ofegante que vem do fim da madrugada
que traz o futuro
que se rasga em presente
que nos livra da noite com os primeiros raios tímidos de sol

manhã sem sutileza, quase capital
a neblina insistente encobre com o cinza o que antes também já era cinza
um novo dia trazendo aquela mesma velha oração
enferrujada pelas horas

os olhos que contemplam o céu azul-chumbo
se enchem de esperança e se fecham finalmente
repouso minha fé e meu corpo
nas cinzas da noite que se foi
foram tempos difíceis eu sei.

marcelozorzeto

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

se era

se era tanto que fosse mais
se era mau que fosse caos
se era pouco que fosse louco
se era paz que fosse cais
se era escuro que fosse um muro
se era bomba que fosse sombra
se era eu que fosse um breu

se era tanto que fosse caos
se era mau que fosse louco
se era pouco que fosse muro
se era paz que fosse cais
se era escuro que fosse sombra
se era bomba que fosse breu
se era eu que fosse mais

se era tanto que fosse muro
se era mau que fosse sombra
se era pouco que fosse breu
se era paz que fosse mais
se era escuro que fosse caos
se era bomba que fosse cais
se era eu que fosse louco

marcelozorzeto

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

a borboleta


leve
indelével
mármore e flor
efêmero
tempos
dores e encontros
mistério


marcelozorzeto
encontrar é estar aberto ao(s) desconhecido(s)
é como dar um passo no escuro
você sente o chão sair do lugar
um momento de suspensão
e de repente nos conectamos com uma nova e surpreendente parte de nós mesmos

o espaço entre o pé que flutua e o chão
é o tempo que dura o medo
um abismo imaginário
é um suspiro de ausência
que em segredo se desfaz
e nos torna mais potentes

viver é se atirar em pequenos abismo diários.



marcelozorzeto

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

para ser lido em voz alta e ficar sem fôlego

adorno o mar fugir à morte amar
a dor no ar voar a sorte azar
calor calar sorrir o forte um par
viver velar ir ver rever o lar
cantar partir sem ter sentir atar
ventar cair sorver sorrir chorar
chover voltar nascer crescer vidar
marcelozorzeto

sábado, 19 de setembro de 2015

da minha janela vejo um céu mono-estelar

da minha janela vejo um céu mono-estelar
minha janela vejo um céu mono-estelar da 
janela vejo um céu mono-estelar da minha 
vejo um céu mono-estelar da minha janela 
céu mono-estelar da minha janela vejo um

marcelozorzeto

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

um novo velho amor

dentro do meu peito corre uma nova brisa
sopra leve um doce riacho
treme um sorriso tímido e suave e um coração
pois um amor me bate certeiro na alma
sinto uma alegria transparente de existir mesmo sem me entender por completo presente nesse finito universo da vida
esse amor pulsa forte, impulsiona
como um rio que rompe represas
arrebenta as comportas
toma seu lugar de direito
e repousa plácido sobre a antiga várzea
eu sou agora apenas inundação.

marcelozorzeto

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

fazer teatro

fazer teatro é morrer um dia a menos todos os dias

marcelozorzeto
não dá pra se dizer que acertou sem nunca ter visto o errado, o erro só existe em função do que é dito acerto. Já o amor não é antônimo de ódio, nem aqui nem no Japão. Eles quase sempre coabitam o mesmo coração escancarado.

marcelozorzeto

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

retalhos da estação

palavras de açúcar
na língua o palato
saliva na boca
saúva no prato
ao sol de setembro
garapa de cana
engenho de verso
abelha rainha
castelo de nuvens
contente (manhã)
meus olhos desejam
os dentes cravados
em fruta mordida
completos sabores
em meio a sorrisos
nas presas palavras
singelos amores
sem culpa sem dores

marcelozorzeto

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

imagine o tempo

imagine o tempo sem a gente pessoas sem os rios sem o céu sem os pássaros imagine o tempo sem a dor saudade sem o sol sem a escuridão sem o paladar imagine ele o senhor tempo tempestade sem nossas vidas em suas mãos imagine o tempo úmido sozinho quase louco contando os segundos sob um guarda-chuva preto imagine o tempo já seco se perdendo entre as horas sem poder manipular o destino das coisas imagine o tempo passado fadado ao esquecimento dos dias dos meses dos anos décadas milênios imagine o tempo desaparecendo infinito sem morte sem deus sem mais mistérios.

marcelozorzeto

ah, o capitalismo e seus sentimentos


terça-feira, 8 de setembro de 2015

desabafo sobre mim mesmo

palavras entre parênteses? de quantas você precisa?
reticências intermináveis, vírgulas desnecessárias
raspas de metáforas, conjunções enferrujadas
preposições despropositadas te servem exatamente para que?

não me venha com as nomenclaturas do seu balcão de ofertas.
o pior analfabeto é quem não entende o sentimento,
na exclamação de um sorriso sincero mora o sentido exato do mundo
mora o meu coração e o seu.
já os olhos, esses podem ser enciclopédias enquanto brilham.


marcelozorzeto

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

tenho saudade

tenho saudade de gente bem simples
café na garrafa, passado na hora
biscoito maisena manteiga e pipoca

tenho saudade bom dia boa tarde
boa noite amizade e sentar na calçada
conversa tão boa em volta da mesa

tenho saudade da mãe preocupada
chamando pra janta cadeira de área
irmãos pra brincar jogar bola e pai

tenho saudade do cair da tarde
da rede esticada livros e varanda
gente engraçada alegria e sorriso

tenho saudade de olhar para a serra
andar lentamente calçada e cidade
molhar os meus pés na beirada de rio

tenho saudade de grilo e cigarra
escuridão ver estrela do cheiro de mato
vaga-lume sereno viola e canção

tenho saudade de cão vira-lata
cafuné no focinho lambuza de baba
rolar no gramado até a escuridão

tenho saudade correr no campinho
jogar pelas linhas de ser artilheiro
abraço apertado na hora do gol

tenho saudade de fruta no pé
fiapo nos dentes bigode de manga
correr marimbondo ferroada que dói

tenho saudade subir no telhado
madrugada escura estrelas milhares
desenhos com nuvens um sonhar que constrói

tenho saudade chuva de verão
roupa suja de barro bicicleta e ladeira
vento no meu rosto criança e quintal

tenho saudade de mim nisso tudo
vida pela frente de ter pés descalços
gramado jardim tramela janela chá quente roseira e jasmim coração.


marcelozorzeto

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

coração cão

no meu peito cão vagabundo
coração que vira e mexe me late
latente cão vasto mundo 
potente zona de amor e combate
acuado pela raiva, rua dos fundos
bomba e sangue na avenida escarlate
um café bem forte, imensidão, chão imundo
tem sempre na vida a hora do cheque-mate

em meus olhos não permitirei o ódio fecundo
mesmo que o monstro de mim mesmo me arrebate.


marcelozorzeto

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Eta vida besta, meu Deus

hoje de manhã, enquanto lavava a louça da janta de ontem
pensava na vida, na morte e no medo
um passarinho que canta me distrai
o prato ensaboado escorrega das mãos
tento apanhá-lo
corte no dedo
sangue na pia
band-aid e mertiolate
"Eta vida besta, meu Deus. "

marcelozorzeto

arrepio

O que é um arrepio,
senão uma oração da pele no templo-corpo
território de toque
poros em erupção
pelos ouriçados em ereção
profanação do sagrado
no altar dos desejos
O que é um arrepio
senão o próprio coração
em ritmo de carnaval.

marcelozorzeto

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

canção de Belchior

a minha tristeza é como uma canção do Belchior
um olhar lacrimoso a observar um avião
como medo que ele caia sobre a cabeça da nossa cidade

marcelozorzeto

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

manifesto s

abaixo os lábios cinzentos de concreto e ódio...
e que toda palavra proferida saia com gosto de cafuné de mãe
e cheiro de bolinho de chuva com café passado na hora.

marcelozorzeto

terça-feira, 25 de agosto de 2015

breve cordel da reconciliação

ando calmo pelo avesso e respeitando meus tropeço...
quer tomar um café, prosear e matutar um recomeço?
te dou até meu telefone se quiser, ou quem sabe o endereço
mas calma lá também, pois meu coração não é feito de gesso!


marcelozorzeto

sobre mares e partidas

há corações que partem e a gente emenda
há também os que partem e não voltam mais
numa selva de partidas, por favor, não se ofenda
pois dor e saudade devem permanecer no cais
para as embarcações, navegar é vital
nesse mar que bate e nunca cessa.

marcelozorzeto

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

águas calmas

na mesma pele que sente esse frio de agora
é onde tenho passado minha vida inteira à flor
no amor que transpiro, me refresco
com os poros que transbordam rios lodosos inundando o coração
o arrepio do toque da maré
o sal na língua molhada
o beijo roubado em Iemanjá
me parecem tão exatos quanto o porvir dos meus sentimentos
que não virão.

marcelozorzeto

domingo, 16 de agosto de 2015

canção de domingo

esse canção é pra você que sai pela porta da frente e nunca mais volta
perde o endereço, esquece o ponto referencial
é uma canção reticente, um pouco de mim, sim, anda por demais bem carente
sem quase nenhum nutriente, quase um biscoito de água e sal
não tem refrão, nem estribilho e a melodia é bem cafona
e neste verso, como sem inspiração, pra rimar, enfio sem fazer sentido, uma canção da Madonna
(Wanting, needing, waiting
For you to justify my love)
mas por mais que te pareça confusa e inapropriada, essa canção ainda não está morta
pois relembrar o encontro, o encontro que celebra a vida, faz chover na minha aorta
(meu coração hortaliça, tem cheiro verde e alho poró
e tempera minha vida, como se só existisse uma só)

dedico esses versos bregas de domingo
pra você que não sabe por aonde anda
mas se por acaso encontrar minha vó em algum bingo
diga que mando um beijo à dona Vanda

e se ainda por acaso um dia decidir fazer o caminho de volta
pois encontrou o mapa perdido da minha cidade
saiba que o abraço ainda vai sim, ser daqueles apertados, que nunca se solta
pois um dia fomos vizinhos de corpo, de alma e cumplicidade.

marcelozorzeto

Diálogo em versos com Gisele Jota sobre um Brasil coxinha

Eu:  A nossa moral é de-formação pura
       vivemos um momento de fritura
       coxinha de ditadura
       queres a volta da farda hostil?
       és uma criatura imbecil


Ela: Moral frequentemente dura 
       travestida de candura 
       elite adormecida (pura?)
       jura que sentias falta do vil?
       és brasileiro digno de covil

                   

Eu: ai, essa candura gordurosa!
      dessa gente duvidosa

      eu quero estar bem distante
      seja no pensamento que viaja
      seja montado num elefante!


marcelozorzeto

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

escrevo na contra-mão do futuro
e me sinto como em meus versos
sou piegas, sou também casmurro
nas profundezas me acho imerso
abro mão do meu passado
canto a lua e canto o sol
sou um caipira embasbacado
nesta cidade caracol
o verbo é meu presente
danço nu na minha tribo
nesse mundo a mim ausente
ser escravo eu não consigo
sobe o tempo devagar
como a ave voa longe
trago no peito meu amar
onde a cicatriz se esconde
andorinha em tempestade
relâmpago na montanha
chove forte na cidade
nunca tive pressa tamanha.
marcelozorzeto
rasgou suas costas num caco de telha
a pele vermelha
o sangue vermelho
levou 3 pontos e um café com leite
é, a vida deixa marcas
que duram uma vida inteira
pedaços da gente que ficam pra trás.


marcelozorzeto

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

sou razão e sou rasura
sou o pão e a penúria
extrato amargo de céu
nesse chão vil de feiura
sou um cão, pura lisura
numa selva-arranha-fel
Sou Jasão e noite escura
paralela estrutura
nesse jazido cordel.
marcelozorzeto

sexta-feira, 31 de julho de 2015

e o som da palavra silêncio é ensurdecedor 
se não me calo, me curvo diante da minha estupidez 
no vácuo, somos sábios
a poesia é também feita de gestos e olhares.

marcelozorzeto

quarta-feira, 29 de julho de 2015

e quem sabe se pra se botar o coração nas palavras
não seria preciso um infarto de poesia
pra desfibrilar a amargura com descargas de amor
e desentupir as artérias do ódio em vão.


marcelozorzeto

terça-feira, 21 de julho de 2015

sejamos da poesia ou da tentativa de.

meu precipício
o princípio do voo
me precipito
me precipita o chão
quedar-me
deixar-me cair
um copo
um corpo
cansado e torto
se desenha no espaço
azar desde o início
asas e o acaso
pausar o coração
(meu vício)
na dissonância do verbo
um olhar de estrelas
azul-escarlate
cinza-estranho e escuridão


marcelozorzeto

rotina

todos os dias o sol me amanhece em silêncio
(quando nubla é pra eu dormir até mais tarde)
depois me entardece em ruídos calados
num coerente carinho de quentura de abraço de mãe
depois vem a lua e me anoitece com todo cuidado
adormeço pra me madrugar de sonhos
pré amanheço de estrelas ainda ávidas
do orvalho e cheiro de café fresco e hortelã
o meu tempo sou eu
o meu tempo sou eu e o céu
teimosia da vida
filho da árvore
a minha mãe natureza
sou eu natural do milagre do mundo.
marcelozorzeto

segunda-feira, 20 de julho de 2015

amigo de café
amigo de cerveja
amigo só de fé
amigo que lê Veja
amigo de axé
amigo de peleja
amigo cafuné
amigo da inveja
amigo bem mané
que amigo sempre seja,



marcelozorzeto

sexta-feira, 17 de julho de 2015

confesso que enlouqueço, que tropeço e que padeço, e que me faço de sonso sem nenhum adereço. que me canso de tudo e que me calço aos soluços, de sutilezas adornadas e sensações sem fins lucrativos nesse longo percurso. e que pra acertar o alvo em cheio, com sorte, sem errar nos meus anseios, ou perder o meu próprio norte, é preciso despencar sem medo, subir ao céu da morte, tocar a escuridão com os dedos, num profano e profundo corte, pra me fingir de forte até o dia do meu desenredo.

marcelozorzeto

quarta-feira, 8 de julho de 2015

o ontem é sempre o dia em que ainda não morremos com certeza
no hoje há sempre a possibilidade insana de não existir o amanhã.

marcelozorzeto

quinta-feira, 18 de junho de 2015

segunda-feira, 15 de junho de 2015

meu verso não canta deus
nem o diabo
meu verso canta o silêncio
verbo ateu
entre os espaços das palavras

marcelozorzeto

segunda-feira, 1 de junho de 2015

é bem difícil ser síntese
todos gozam a promiscuidade de ser prolixo
conheço pessoas que são abreviadas
no entanto, me perco com tantas siglas.


marcelozorzeto

sexta-feira, 22 de maio de 2015

São Paulo apressada
nessa pressa sem apreço
não me abraçam
na rua da Consolação
Precisa-se passar depressa.
precisa-se Passar depressa!
precisa-se passar dePressa?
paga-se um preço precioso
por se passar assim, sem afago
sem afeto eu posso me afogar
pois então eu penso
folgo
precipito-me
passo-a-passo
pouso
pássaro
preguiçoso
impreciso
fumo a fumaça que mesmo faço
adormeço para sonhar
espero o sol a divagar
e são, como nunca sou
amanheço querendo ser gente
tenham paciência por favor
falta paçoquinha, meu AMOR.
marcelozorzeto

sábado, 16 de maio de 2015

a liberdade é meu abismo favorito
sem saber pra onde vou, voo
? alguém que me indique direções

a descoberta dos meus limites
me tomou a vida inteira-tentativa de viver
?alguém pronto pra me doar seu sangue estéril

estou perdido em meus próprios valores
eu os inventei, eu mesmo criei a besta
e agora solicito um norte, mais ao sul
um hemisfério quase morto
   
ser livre é o pior pesadelo
ser livre é morrer antes do tempo
sou palavra apenas
sou um livro congelado
e o amor não salva ninguém.

marcelozorzeto

segunda-feira, 11 de maio de 2015

em cada palavra dita
há um pouco de dente
lábio
língua
gengiva
saliva
hálito
e coração

a palavra dita
é beijo soprado no rosto
ou na nuca
na boca do estômago
com um fonema-soco

em cada lágrima
que escorre a retina
vejo olhos
olho cílios
sinto pele e gosto
sede e sangue
e ferro

em cada olhar
um pouco de alma
calma e terra e céu
chão de pássaros
cantam azul

a cada dia
um pouco de vida
cheia de morte
talvez azar
talvez não
sorte


marcelozorzeto

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Tempo

não há motivos pra tentar entender o Tempo
que deduzo ver passar...
pois sou eu a passar por Ele (e não o oposto)
você Tempo, você e a Sua monstruosa inércia
que me invade e me entope as ideias
com dias e artérias
meses e décadas inteiras estragadas
solstícios, equinócios e carnavais ruins
no passado Tempo, sou eu de lembranças míseras
e futuros que talvez não
no presente, sendo estupidamente invisível
consigo, às vezes, me enxergar
estou sempre muito ocupado na tentativa do viver
me esqueço de estar
e não deixo de estar, mesmo sem querer
como um trem sem estação ou paradeiro
o Tempo apenas segue o seu trilho de fio distante
num carretel de vida de todo sempre por onde nasço
passo, morro e me costuro
ser só passageiro, só
desde o antes, até o nunca
vago lá
vagueio aqui
vagalumeio por entre luzes
de vida
pra me tornar tempo e nada e mais.

marcelozorzeto

quarta-feira, 22 de abril de 2015

No precipício era o verbo e o verbo era adeus
Ele, o precipício, era deus
Já o verbo, princípio de saudade.

marcelozorzeto

sexta-feira, 10 de abril de 2015

Tietê

Como posso ser de um rio tiete?
Esgoto em minha vida
Desgosto a céu aberto
Tietê dos meus dramas.

marcelozorzeto

sábado, 28 de março de 2015

há sempre um grito desesperado de sangue ao se atravessar a avenida de um coração
um cheiro amargo de ferrugem no canto da língua
sentimentos de aorta
um equinócio de saliva
mil saúvas de solidão

podem as artérias chorar?
e as coronárias em convulsão?

minha jugular caótica
uma carótida exceção
é sina de quem se atropela
sempre que atravessa
a avenida de um coração

marcelozorzeto

beijo da língua

nem tudo o que não é o que parece ser
realmente não é o que parece ser
às vezes é pura dissimulação
cada vez mais acredito em metáforas
e menos em desaforos explícitos.



marcelozorzeto

domingo, 22 de março de 2015

escrevo torto
por linhas tensas

palavras retas
de um anti-herói

sou o deus do revés
um diabo ranzinha

um vendedor de churros
na esquina da Augusta

e não estou só

marcelozorzeto

quarta-feira, 18 de março de 2015

...e a essa gente sã
que se acha sã
que acredita nisso com afinco
que grita alto sua fé pelas paredes das igrejas
que vive a mostrar atestado de saúde
em reuniões de condomínio
e promete pro espelho de dedos cruzados
a elas, eu desejo que toda sua "razão"
e o delírio estúpido da sua sanidade
caiam por terra como uma trombose hepática
uma necrose isquêmica dos sentidos


um salve pros aviões sem asas
e a crença de que somos
verdadeiramente
seres inteligentes

marcelozorzeto

sábado, 14 de março de 2015

É no intervalo da ausência
que invento o mundo
as sombras que me abrigam
as sobras que me invenenam
a sede que me afasta do mar

e de braços com o acaso
apenas sinto o gosto do vinagre
e a ferrugem das horas
me corroem o existir.

marcelozorzeto

quarta-feira, 11 de março de 2015

A poesia é o pensamento decantado
e em ebulição
química das palavras
reação de sentimentos
em cadeia
marcelozorzeto

segunda-feira, 9 de março de 2015

meus tantos planos mortos
por inanição
ideias ressuscitadas, reencarnadas
em um corpo equivocado
meus sonhos todos tortos, remendados
a esparadrapo e contradição

meus prazeres pré-moldados, de gaveta,
reprimidos, nos gritos nunca extravasados
em silêncio com afetos invertidos

são as maravilhas da vida em contrário efeito
nesse anti-horário peito
sou mesmo um antiquado desbunde
com a conta bancária em profunda escuridão

marcelozorzeto

sexta-feira, 6 de março de 2015

a cura

o louco
a louca
a loucura
todos tem salvação
tem uma cura:

não se manter são
o louco
a louca
a loucura

marcelozorzeto

quarta-feira, 4 de março de 2015

calar-se

quero sair do meu próprio contexto
me rascunhar até que alguém me escreva

marcelozorzeto
queria ser poeta
me tornei um pateta

marcelozorzeto

suicídio

Não aguentava mais o mundo e num ato de desespero, abriu a janela de seu apartamento, olhou para baixo e lá se foram 17 andares. Não houve nenhuma chance pra seu computador.


marcelozorzeto
nascer tem me tomado um tempo quase infinito
um tempo que não tenho
falo de nascer de verdade, não da expulsão do paraíso
eu, enquanto (desa)feto do meu próprio parto
não conheço o mundo nem o vizinho da frente
invejo as pessoas que nascem,
que se dão à própria luz.



marcelozorzeto

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

receita da vovó

200 gr de auto-piedade
150 gr de solidão
1 lata de puro ódio
1/2 maço de compaixão
2 colheres de chá de esperança
1 quilo de amor ou desilusão
500 gr de coração congelado com o tempo
3 xícaras de dissimulação

Modo de preparo

numa sociedade qualquer, junte todos os ingredientes, bata no liquidificador, leve ao fogo alto do inferno e você verá tudo desandar.

marcelozorzeto
um poema é momento
cravado no tempo
a poesia é o nu
que se rompe em silêncios
eterno monumento
ao acaso que afronta
e beija
o rosto de flor

resto de Maio
no sal da manhã
desnudo-me

marcelozorzeto

domingo, 8 de fevereiro de 2015

o verde cravado no coração capital
concreto pulmão na cidade cimento
alegria com cheiro de relva molhada
viaduto e a tristeza que vai com o vento.

refletir pela metrópole que não reflete por si só


refletir pela metrópole que não reflete por si só
refletir pela metrópole que não reflete por si só
refletir pela metrópole que não reflete por si só
refletir pela metrópole que não reflete por si só
refletir pela metrópole que não reflete por si só
refletir pela metrópole que não reflete por si só


refletir pela metrópole que não reflete por si só
refletir pela metrópole que não reflete por si só
refletir pela metrópole que não reflete por si só

refletir pela metrópole que não reflete por si só
refletir pela metrópole que não reflete por si só
refletir pela metrópole que não reflete por si só
refletir pela metrópole que não reflete por si só

marcelozorzeto
Qualquer dia, eu subo na primeira palavra que passar pela minha frente e fujo pelas entrelinhas.

marcelozorzeto

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

na rua do amor

na rua do amor, a amargura sempre ultrapassa
deixando pra trás poeira e sorrisos sujos
permaneço saudade, sou todo outono
mas gosto do inverno ou verão com mar

na rua do amor ama-se bem pouco
não se olha o hoje, perdem-se nos amanhãs
sou todo farpas, pele em chamas
parto naturalmente em nuvens

na rua do amor, o amor desfalece
sobra você menos eu, mas éramos nós
quem é de verdade? a arte nua
a vida cruamente insana da cidade sobre mim?

na rua do amor faz-se prédio
só há sombras e remédio amargo
sou todo censura e embargo sonhos
preconceitos pré-históricos

na rua do amor não há rima perfeita
nem clima pra isso
estou só preso a um poste
pelo pescoço, a carne o osso e desespero

na rua do amor agora há tédio
não há drama nem gramado
flutuo... sou ponte, público concreto
coração passeio batimento e rotina

na rua do amor instituíram sentido único
contra-mão, contra a vontade
um cinema fechado, um filme enlatado
desbotado cartaz

na rua do amor moramos todos nós
mesmo adereço cinza-opaco
espero uma carta, me debruço na janela
todos passam sem envelope em mãos

na rua do amor moramos nós
e de amor não entendemos
chove no asfalto, o bueiro entupido
água que sobe, morro sempre afogado
na rua do amor.


marcelozorzeto