quarta-feira, 5 de setembro de 2012

poema número zero

tenho me despedaçado
ultimamente
intensamente
inversamente
violentamente
perdido partes de mim por aí
pelas ruas
pelas cinzas
pelo entulho
por detrás de cada placa de PARE

debaixo do tapete da sala
minúsculos “eus” por toda parte
carne, alma
calma/carma
sentimentos descartáveis, não descartados
empilhados
sentimentos que expiram
com prazo de validade

sinto tanta falta
de mim mesmo

sim e não misturados no mesmo copo sujo de café
se o resto é o que há para o agora, comerei
a sobra de alguns
é o banquete de muitos
se a minha alma se perde entre os céus
me embriago com a chuva
bebo do mesmo rio em que elas choram

tenho me desperdiçado
ultimamente
imensamente
pateticamente
poeticamente
como um pedaço de carne deixada no prato
muitos sentem fome, de vida e de carne
sinto a fome dos sonhos que ficaram pra trás

a luz me cega e a vida é pouca
os filmes em branco
negativos
"unprinted"
sem som, sem sombra
assombração
a falta que me faz tudo aquilo que me foge aos olhos
a sobra de tudo que forjo em minha cabeça
a casa que me viu crescer
a rua que me caminhou pelos primeiros passos
o som do azul quando se junta ao amarelo no pincel cego do artista
olha pro céu meu amor
a chuva já vem vindo

marcelozorzeto